segunda-feira, 12 de abril de 2010

Retrovisor

A cidade se devora em cada carro
parado, em cada sinal fechado, em cada
pedaço de vida mal resolvida. As buzinas
teimam em protestar como se a quebra do
silêncio pudesse trazer de volta as
escolhas que eu nunca fiz. O que passou
é passado, vejo pelo retrovisor. Não há
mais tempo para seguir por outra avenida.
Jamais saberei quem eu seria numa outra via
de acesso. Se eu tivesse tomado um atalho,
uma rua estreita qualquer, que tipo de pessoa
eu teria me tornado? Não sei. Mas gostaria
muito de saber. Pelo retrovisor, vejo todas
as pessoas que eu poderia ter sido e não fui.
Vejo todas as ruas por onde nunca me atrevi
a passar. Pelo retrovisor, vejo tudo o que
eu escolhi não viver enquanto a cidade me
devora dia-a-dia.
(Maíra Viana - O Teatro Mágico em palavras)